A teoria freudiana e as psicopatologias da atualidade
Pela Dra. Claudia C. Maquiaveli
Neuroses atuais e psiconeuroses
Em 1890 o jovem Freud iniciou seus estudos sobre o tratamento das neuroses atuais e psiconeuroses, ambas conhecidas como um conjunto de doenças psíquicas que acarretam distúrbios de personalidade. Nesse mesmo ano, Freud propôs dividir as neuroses em dois tipos:
Neuroses atuais: que não estariam relacionadas aos recalques da infância, mas sim às frustrações sexuais recentes na vida do indivíduo. Freud propôs que as neuroses atuais teriam como causa ou o excesso de masturbação, que se manifestaria como neurastenia, ou uma estimulação sexual não descarregada, que resultaria na neurose de angústia e na hipocondria.
Psiconeuroses ou neuroses clássicas: seriam as afecções patológicas originadas de traumas da infância. Nessas estariam incluídas a histeria, fobias e obsessões. Do ponto de vista da psicanálise contemporânea, podemos identificar a neurastenia como a síndrome da fadiga crônica (Burnout), relacionado ao excesso de horas dedicadas ao trabalho e de forma exaustiva. Enquanto a neurose de angústia é o que reconhecemos como Síndrome do pânico. A hipocondria tem como correspondente todas as somatizações. Além disso, as atuais doenças psicossomáticas graves, como adições (álcool, drogas elícitas, etc) e parte dos transtornos alimentares, agrupados no heterogêneo grupo dos quadros Borderline, provavelmente, seriam agrupados por Freud dentro do grupo das neuroses atuais.
É importante ressaltar que na terapia psicanalítica, o analista trabalha com os sintomas do analisando. Por esse motivo, não fazemos nenhum tipo de diagnóstico. Esse deve ser realizado cuidadosamente pelo médico psiquiatra. Quando há a necessidade do uso de psicofármacos, também é o psiquiatra que deverá realizar a prescrição do medicamento específico.
A psicanálise trabalha com as teorias estabelecidos sobre a formação da personalidade propostas por Freud e pelas escolas pós-freudianas, baseadas na estruturação da formação das neuroses, psicoses e perversões. Todos nós temos um pouco de todas essas construções, com o predomínio de uma delas, que resultam em sintomas característicos. A função do psicanalista é auxiliar o analisando a entender a personalidade que foi construída, desde a infância até a fase em que o sujeito se encontra, e relacioná-la aos sintomas e traumas de infância inconscientes.
Um dos objetivos da análise é que se processem mudanças sutis ao trazer o conteúdo traumático reprimido, que poderá ser reelaborado e ressignificado. Mas, para atingir o estado de redução do sofrimento, sintomas e angústias, é necessário que o analisando passe por algumas etapas da análise. Quer saber mais?
O início da psicanálise: a histeria e a associação livre
Sigmund Freud (1893-1930) foi um médico neurologista e psiquiatra austríaco, criador do método psicanalítico. Freud realizou os primeiros estudos sobre a histeria ao lado do médico psiquiatra e fisiologista Josef Breuer (1893-1985).
Anteriormente, Freud havia realizado um estágio no hospital Saupêtrière em Paris, sob a supervisão de Charcot, um importante psiquiatra que humanizou e colocou em evidência a importância do estudo da histeria.
Freud e Breuer realizaram importantes avanços no tratamento da neurose histérica com a utilização da hipnose. No entanto, a observação de que muitos dos sintomas neuróticos tinham um desaparecimento apenas temporariamente e que algumas pacientes não poderiam ser hipnotizadas (o próprio Freud não se considerava um bom hipnotizador), levou-o à busca de uma nova forma de tratamento.
Nesse momento, Freud inicia o processo de elaboração e aplicação de um novo método de análise: a associação livre. Um método que consistia em deixar o paciente falar livremente o que viesse à sua mente sem restrições ou julgamentos. No início, Freud passou a utilizar o método da associação livre com suas pacientes histéricas sem abandonar a hipnose. No entanto, o tratamento da paciente histérica Emmy Von N levou-o a uma importante descoberta. A Sra. Von N chamou a atenção de Freud quanto às constantes indagações feitas por ele durante o processo de análise, que estariam interrompendo a sua fala e atrapalhando o acesso ao conteúdo que deveria ser trazido ao consciente. Esse fato despertou em Freud a consciência da importância da fala livre do paciente e da escuta ativa no processo psicanalítico, como forma de trazer ao consciente conteúdos reprimidos.
"Talvez, por causa desse famoso caso clínico e outros "babados", muitos leigos achem que se forem para uma sessão de análise, o psicanalista não abrirá a boca, isso não é verdade!"
Continuando nossa história...
Através da escuta da fala livre das pacientes, Freud postulou que as neuroses histéricas se desenvolveriam a partir de eventos insuportáveis e traumáticos, ocorridos na infância, que seriam esquecidos e recalcados no inconsciente.
Freud constatou que muitos desses eventos traumáticos na verdade eram fantasias. Essas fantasias eram construídas a partir de impulsos libidinais, geralmente relacionados a um de seus progenitores. Na eminência de que esses impulsos libidinais originados no ID pudessem escapar para o consciente e causar algum dano moral ou social, e percebidos pelo superego, seriam aprisionados (recalcados) pelo ego no inconsciente.
Quando estando no inconsciente e sendo esses impulsos novamente carregados de energia pulsional (catexia) poderiam se separar do seu representante (afeto, objeto ou ideia), em virtude do fortalecimento do ID e enfraquecimento do ego.
Esses impulsos carregados de energia, ao transitar para o consciente, buscariam um novo representante e se manifestariam na forma de fantasias e sintomas característicos das neuroses. Esse retorno ao consciente da carga pulsional reprimida foi denominado por Freud como retorno do recalcado.
Freud observou que ao deixar o paciente falar livremente, poderia trazer à tona os conteúdos do inconsciente que seriam utilizados pelo analista como “pistas” interpretativas que levariam ao conteúdo reprimido. A partir do momento que esses conteúdos reprimidos se tornassem conscientes, o paciente alcançaria a cura e, consequentemente, o alívio ou eliminação dos sintomas. O método de associação livre desenvolvido por Freud, conhecido como a “cura pela palavra”, é a base do método psicanalítico contemporâneo.
"Neuroses todos temos, mas sofrer excessivamente por aquilo que não conhecemos em nós é perder a oportunidade de ter uma vida mais interessante!"